Engrenagem em frente da casa

A chuva dança meu cansaço.

Ensaio algum extremo a 

dentro inimigo.

Tenho só um cronômetro

entalado em potes risonhos.

Um pouco mais de açúcar

cairia bem aos meus olhos.

Pernas rodeiam o quilo 

da carne,

do fastio breve,

da cama intragável

e vasta.

A palavra domina o 

gosto do coentro.

Tempero enfileirado

em sagrados códigos.

Verso folheado a prata.

Verso laureado a brisa.

Grito forjado a pluma.

Quero um vasto crisântemo

em delírio aos quintais.

A lingua que veste as ruas

apenas me prenuncia

circunstância,

rouxinol,

resto de festa aos domingos.

                                                              (janeiro 2023)

Corticoide

Presumi todos olhares

em um só absurdo.

No chão da sala,

o reflexo do tempo não se conforma. 

Um sorriso ou outro acalanta uma xícara de 

chá,

enquanto o conforto silencioso

do meu estômago 

rumina infinitos

feito moscas azuis.

                                                          (janeiro 2023)

Escória de mim

A escória de mim

compadece ao escárnio

em sombras.

Para essa escória de mim

cabe algum regozijo

a pratos mornos.

Aquela escória de mim

que apedreja,

inquieta,

revida

ou insulta,

sabota um sonho

na rebarba dos ventos.

Além da escória de mim,

há um sol quente

escondido entre 

abismos insondáveis, 

consumindo então

o recorte mais robusto

de minha absoluta e 

requintada sordidez.

  

                                                     (janeiro 2023)

Brevidade

Quando o sol gritar o mar

E eu fabricar o céu,

Admito meu deserto

como advento de

poesia.

Enfeito tua resposta,

teu medo,

tua casa.

Anseio o pretérito que

me assombra vasto.

E o ínfimo se recria

enormidade.

Dentro do peito emerge

tempestades,

escorando minha vontade

de escalar sombras.

Há dias em que serei

remorso,

Em outros,

nó partido.

Mas caberia naquele sol,

entre céu e deserto,

todo o mar rodeado

de repentina poesia.

                                                              (janeiro 2023)